Fonte: G1 |
Em breve, quando olhar sua certidão de nascimento, a psicanalista Brune Bonassi, de 31 anos, vai ver no papel aquilo que já é na vida real.
No dia 22 de maio, Brune se tornou a primeira pessoa a conseguir, na Justiça do Ceará, o direito de ser identificada como “não-binária” em sua certidão de nascimento.
A sentença a favor da retificação foi proferida pela 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça (TJCE) após um processo que durou mais de um ano e meio no qual Brune foi representada pela Defensoria Pública do Ceará.
“Isso é muito importante porque o nome e o sexo mal denominados geram muito sofrimento psicológico e perda da saúde em pessoas não-binárias e trans em geral”, afirma Brune.
Embora tenha definições amplas, de modo geral o termo “não-binário” é usado para se referir a quem não se identifica ou não se sente pertencente a nenhum dos dois gêneros tradicionalmente construídos, isto é, masculino e feminino.
Desde 2015, Brune passou a se identificar oficialmente como uma pessoa não-binária. E, desde então, vinha convivendo com um descompasso entre sua identidade e seus documentos. O périplo na Justiça teve início em junho de 2022, quando Brune procurou ajuda da Defensoria Pública para alterar um dos sobrenomes e o gênero, originalmente registrado no feminino.
Desde 2018, pessoas trans e travestis podem alterar nome e gênero diretamente no cartório. Contudo, o ordenamento jurídico brasileiro não prevê a mesma possibilidade para pessoas não-binárias. Logo, para uma pessoa não-binária conseguir retificar seus documentos é necessário acionar a Justiça – o que ainda assim não é garantia de obter o direito à retificação.
Quando o caso de Brune foi analisado em primeira instância, em junho de 2023, a justiça cearense decidiu pelo não reconhecimento da não-binariedade. A Defensoria Pública recorreu da decisão e o processo foi parar no TJCE, onde a decisão foi a favor da psicanalista.
“Para pessoas trans a gente já tem um provimento que permite a retificação administrativa. Infelizmente, enquanto pessoas não-binárias, precisamos enfrentar todo esse processo jurídico longo e custoso. Mas hoje temos uma boa notícia”, comemora.
“Eu não me adequava nos grupos de meninas nem de meninos, era uma criança muito solitária. Sou autista também. Passei por vários processos depressivos, e não conseguia me reconhecer na minha autoimagem”, conta.
A partir da graduação em psicologia, Brune passou a estudar temas psicanálise, gênero e sexualidade, e assim também começou a compreender melhor a si mesma. O tema acompanhou sua trajetória acadêmica: seu doutorado, por exemplo, foi sobre o acesso de pessoas não-binárias à saúde.
E foi assim que Brune encontrou uma resposta para muitas de suas dúvidas.
“Em 2015 eu conheci outra pessoa do meu grupo de pesquisa que se identificava como não binária, e aí entendi que era uma identidade possível. Pelo estudo de filosofia e ciências sociais, eu comecei a não ver sentido em nenhum dos gêneros, e não binárie foi a única palavra que coube em mim”, explicou.
Em 2018, quando foi permitida a retificação do nome diretamente nos cartórios, Brune logo realizou o procedimento e modificou seu nome. No entanto, a normativa não permitia alterar o gênero para “não-binário”. Para Brune, portanto, o campo gênero continuava como um impedimento – até agora.
“A gente estava com medo de não dar certo. A decisão levou um ano e meio para sair e, no meio disso, muitas informações circularam, ao ponto até de a juíza chegar a pedir laudo psicológico, uma coisa que é condenada pelo Conselho de Psicologia e por organismos internacionais. Agora que deu certo, eu já estou pensando em como vai ser para retificar os outros documentos. Preciso ver quais vou ter que alterar”, pontua.
Atualmente, outras quatro pessoas não-binárias também aguardam na Justiça cearense o direito de retificar o gênero em seus documentos.
O caso de Brune, de acordo com a Defensoria Pública, abre um precedente importante para obter decisões favoráveis para os que ainda estão aguardando uma resposta.
“O reconhecimento da identidade não binária já é uma realidade em outros estados. O Judiciário cearense toma, então, uma decisão histórica de garantir o direito de qualquer pessoa ter sua identidade respeitada”, aponta a defensora Mariana Lobo, que atuou no processo.
Fonte: G1
A sentença a favor da retificação foi proferida pela 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça (TJCE) após um processo que durou mais de um ano e meio no qual Brune foi representada pela Defensoria Pública do Ceará.
“Isso é muito importante porque o nome e o sexo mal denominados geram muito sofrimento psicológico e perda da saúde em pessoas não-binárias e trans em geral”, afirma Brune.
Embora tenha definições amplas, de modo geral o termo “não-binário” é usado para se referir a quem não se identifica ou não se sente pertencente a nenhum dos dois gêneros tradicionalmente construídos, isto é, masculino e feminino.
Desde 2015, Brune passou a se identificar oficialmente como uma pessoa não-binária. E, desde então, vinha convivendo com um descompasso entre sua identidade e seus documentos. O périplo na Justiça teve início em junho de 2022, quando Brune procurou ajuda da Defensoria Pública para alterar um dos sobrenomes e o gênero, originalmente registrado no feminino.
Desde 2018, pessoas trans e travestis podem alterar nome e gênero diretamente no cartório. Contudo, o ordenamento jurídico brasileiro não prevê a mesma possibilidade para pessoas não-binárias. Logo, para uma pessoa não-binária conseguir retificar seus documentos é necessário acionar a Justiça – o que ainda assim não é garantia de obter o direito à retificação.
Quando o caso de Brune foi analisado em primeira instância, em junho de 2023, a justiça cearense decidiu pelo não reconhecimento da não-binariedade. A Defensoria Pública recorreu da decisão e o processo foi parar no TJCE, onde a decisão foi a favor da psicanalista.
“Para pessoas trans a gente já tem um provimento que permite a retificação administrativa. Infelizmente, enquanto pessoas não-binárias, precisamos enfrentar todo esse processo jurídico longo e custoso. Mas hoje temos uma boa notícia”, comemora.
Entendimento e aceitação
Segundo Brune, os problemas para se encaixar no gênero feminino que lhe foi atribuído ao nascer vêm desde a infância e geraram problemas com a família, natural de Santa Catarina. Hoje mora em Mulungu, no Ceará.“Eu não me adequava nos grupos de meninas nem de meninos, era uma criança muito solitária. Sou autista também. Passei por vários processos depressivos, e não conseguia me reconhecer na minha autoimagem”, conta.
A partir da graduação em psicologia, Brune passou a estudar temas psicanálise, gênero e sexualidade, e assim também começou a compreender melhor a si mesma. O tema acompanhou sua trajetória acadêmica: seu doutorado, por exemplo, foi sobre o acesso de pessoas não-binárias à saúde.
E foi assim que Brune encontrou uma resposta para muitas de suas dúvidas.
“Em 2015 eu conheci outra pessoa do meu grupo de pesquisa que se identificava como não binária, e aí entendi que era uma identidade possível. Pelo estudo de filosofia e ciências sociais, eu comecei a não ver sentido em nenhum dos gêneros, e não binárie foi a única palavra que coube em mim”, explicou.
Em 2018, quando foi permitida a retificação do nome diretamente nos cartórios, Brune logo realizou o procedimento e modificou seu nome. No entanto, a normativa não permitia alterar o gênero para “não-binário”. Para Brune, portanto, o campo gênero continuava como um impedimento – até agora.
“A gente estava com medo de não dar certo. A decisão levou um ano e meio para sair e, no meio disso, muitas informações circularam, ao ponto até de a juíza chegar a pedir laudo psicológico, uma coisa que é condenada pelo Conselho de Psicologia e por organismos internacionais. Agora que deu certo, eu já estou pensando em como vai ser para retificar os outros documentos. Preciso ver quais vou ter que alterar”, pontua.
Caso abre precedente para outras pessoas
Com a decisão favorável do TJCE, Brune vai iniciar os procedimentos para alterar tanto sua certidão de nascimento quanto de casamento, um processo que ainda deve demorar mais de um mês.Atualmente, outras quatro pessoas não-binárias também aguardam na Justiça cearense o direito de retificar o gênero em seus documentos.
O caso de Brune, de acordo com a Defensoria Pública, abre um precedente importante para obter decisões favoráveis para os que ainda estão aguardando uma resposta.
“O reconhecimento da identidade não binária já é uma realidade em outros estados. O Judiciário cearense toma, então, uma decisão histórica de garantir o direito de qualquer pessoa ter sua identidade respeitada”, aponta a defensora Mariana Lobo, que atuou no processo.
Fonte: G1
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